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Seis meses de Bolsonaro: a rotina da Presidência sob nova direção

Passeios inusitados, como ida ao mercado, pontualidade, redes sociais e presença em eventos militares e religiosos marcam o primeiro semestre do presidente no Palácio do [...]

Por Redação em 29/06/2019 às 21:49:24


Passeios inusitados, como ida ao mercado, pontualidade, redes sociais e presença em eventos militares e religiosos marcam o primeiro semestre do presidente no Palácio do Planalto. Jair Bolsonaro durante cerimônia de posse

Nelson Almeida/AFP

Prestes a completar seis meses à frente do Palácio do Planalto, na próxima segunda-feira (1º), Jair Bolsonaro se notabiliza por ser um presidente da República que aposta na informalidade de gestos e palavras, na comunicação por redes sociais e na tentativa de um equilíbrio, nem sempre fácil, com suas bases de apoio.

A pontualidade associada à caserna retornou à rotina do Planalto desde a posse de Bolsonaro, em 1º de janeiro, um capitão reformado do Exército. Rigor com horários que contrasta com ações inesperadas e inusitadas do presidente, como ir a pé ao Congresso ou deixar o Palácio da Alvorada para ir ao supermercado comprar xampus.

Nesta reportagem, o G1 apresenta características que marcam a rotina da Presidência nos primeiros 6 dos 48 meses do mandato de Bolsonaro.

O presidente Jair Bolsonaro, no gabinete no Palácio do Planalto, durante reunião no último dia 24 de junho

Marcos Corrêa/PR

Presidente pontual

Bolsonaro chega mais cedo ao Palácio do Planalto na comparação com o ex-presidente Michel Temer. Ele costuma iniciar o dia de trabalho em seu gabinete entre 8h e 8h30. O retorno para a residência oficial, o Palácio da Alvorada, ocorre entre 18h30 e 20h.

Temer, por exemplo, mantinha o hábito de receber ministros mais próximos logo cedo na residência oficial do Palácio do Jaburu, antes de seguir para o Planalto, entre 9h e 9h30. Em dias de semana, era normal o então presidente deixar o Planalto depois das 21h30.

O presidente também costuma ser rigoroso com horários. Ele procura seguir as previsões de embarques em viagens, e as cerimônias no Planalto se iniciam com pouco atraso.

Em maio, por exemplo, Bolsonaro recebeu deputados e senadores do Nordeste no Planalto para um café da manhã às 8h. Parte dos parlamentares se atrasou e o café teve início com muitas das cadeiras vazias, enquanto os retardatários ainda chegavam ao palácio.

Michel Temer e Dilma Rousseff não tinham o mesmo rigor de Bolsonaro com a pontualidade. Atrasos de 20 a 40 minutos eram rotineiros nas cerimônias durante a gestão dos ex-presidentes.

Dia a dia no Planalto

Adepto de discursos curtos em cerimônias, Bolsonaro concede mais entrevistas após eventos no Planalto do que Temer. O ex-presidente enviava recados políticos e destacava feitos da gestão nos discursos, enquanto Bolsonaro fica mais à vontade nos "quebra-queixos", quando jornalistas registram em pé as respostas do entrevistado, muitas vezes em meio a um empurra-empurra.

Ao final das cerimônias no palácio, realizadas nos salões do 2º andar do edifício principal, a imprensa fica à espera do presidente, que costuma atender ao chamado para comentar mais de um tema que está na agenda do dia.

A rotina no Planalto também é marcada por reuniões do chamado conselho de governo, cujos encontros ocorrem às terças-feiras. O conselho é composto por Bolsonaro, pelo vice-presidente Hamilton Mourão e pelos 22 ministros de Estado.

Até o momento, foram realizadas 14 reuniões do colegiado, nas quais ministros relatam as ações em andamentos nas pastas, e Bolsonaro dá orientações aos subordinados.

Temer e Dilma realizavam reuniões ministeriais com menor frequência. Outro ponto que difere as gestões é a transmissão dos discursos do presidente aos ministros. Com Temer, as falas eram sempre transmitidas pela TV oficial do governo. No caso de Bolsonaro, não há transmissão ao vivo.

A gestão de Bolsonaro abriu a porta leste do Planalto, localizada no térreo, que ficava fechada no governo de Michel Temer, sendo aberta apenas em ocasiões especiais, como recepção de autoridades estrangeiras.

Junto com a entrada central, abaixo da rampa do Planalto, a porta se tornou um dos principais pontos de entrada e saída de autoridades de segundo escalão e de parlamentares, entre os quais, os líderes do governo na Câmara, Senado e Congresso. Os ministros utilizam a entrada privativa.

O presidente Jair Bolsonaro e o ministro da Economia, Paulo Guedes, durante transmissão ao vivo em uma rede social

Marcos Corrêa/PR

Redes sociais

Desde a posse, Bolsonaro fez poucos pronunciamentos em cadeia nacional de rádio e TV. O presidente tem nas redes sociais sua principal ferramenta de comunicação, utilizada com sucesso na campanha eleitoral de 2018.

Ele publica diariamente postagens no Twitter, Facebook e Instagram, redes nas quais destaca ações e diretrizes do governo, dá opiniões, faz críticas à imprensa, compartilha mensagens de aliados e por vezes provoca polêmicas, como no caso da pergunta sobre "golden shower".

As redes também geram desconfortos, a exemplo das críticas do filho Carlos, vereador carioca, e do ideólogo Olavo de Carvalho a Mourão e aos ex-ministros Santos Cruz e Gustavo Bebianno.

O presidente também é entusiasta do WhatsApp. Ele já reconheceu que não segue recomendação de sua segurança, que lhe disponibiliza um aparelho protegido por criptografia: "Não tenho nada a esconder", explicou.

Bolsonaro envia mensagens de áudio e compartilha notícias e textos com ministros, parlamentares e apoiadores. O hábito provocou algumas crises no governo, como no caso em que o site da revista "Veja" divulgou mensagens de áudio de WhatsApp do presidente com o então ministro Gustavo Bebianno, que acabou demitido.

Bolsonaro também é adepto das chamadas "lives", transmissões ao vivo por meio de rede social. Tradicionalmente, as "lives" são feitas às 19h das quintas-feiras do Planalto, Alvorada ou de hotéis durante viagens do presidente ao exterior.

Acompanhado do porta-voz Otávio Rêgo Barros, de ministros, outros auxiliares e parlamentares, Bolsonaro comanda a transmissão de uma mesa, como nos tempos de campanha. Ele comenta o dia a dia do governo, antecipa planos e critica adversários – com direito a uma "canelada" aqui e outra acolá.

Em uma das lives, o ministro da Educação, Abraham Weintraub, usou chocolates para explicar o bloqueio no orçamento das universidades e institutos federais. Weintraub colocou sobre a mesa 100 chocolates e separou três e meio para explicar o bloqueio. Enquanto ouvia o ministro, Bolsonaro comeu alguns chocolates.

O presidente Jair Bolsonaro, no Palácio do Planalto, durante café da manhã com jornalistas

Marcos Corrêa/PR

Relacionamento com a imprensa

Crítico da imprensa, Bolsonaro tem procurado nas últimas semanas elogiar o trabalho dos jornalistas que cobrem diariamente o Palácio do Planalto. Em uma ocasião, por exemplo, o presidente se disse "cada vez mais apaixonado pela imprensa".

Bolsonaro criou o hábito de convidar jornalistas para cafés da manhã no Palácio do Planalto. Foram seis encontros com profissionais da imprensa até o momento. Nos encontros, Bolsonaro responde a perguntas dos convidados sobre diversos temas relacionados ao governo, a vida pessoal e a política externa.

Outros presidentes, como Dilma e Temer, optavam por cafés com jornalistas às vésperas das festas de fim de ano, nos quais realizavam um balanço da gestão.

Curto e direto nas entrevistas, Bolsonaro não costuma medir as palavras para externar desconfortos ou expressar opiniões, o que por vezes gera polêmicas.

O presidente já declarou que o nazismo foi um movimento de esquerda, que o Brasil não pode se tornar o país do turismo gay e que foi "completamente equivocada" a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de enquadrar atos preconceituosos contra homossexuais e transexuais como crime de racismo.

Em maio, Bolsonaro chamou de "idiotas úteis" manifestantes que protestaram contra bloqueios de recursos em universidades. Recentemente, ele perguntou se o Congresso desejava transformá-lo em "rainha da Inglaterra" em razão de projeto que previa lista tríplice para direção de agências reguladoras – o trecho acabou vetado por Bolsonaro.

Além das falas à imprensa, Bolsonaro também destacou um militar como porta-voz da Presidência. O general do Exército Otávio do Rêgo Barros é o responsável por repassar a jornalistas informações sobre o governo, além de responder a perguntas.

Os "briefings" ocorrem nas segundas, terças e quartas-feiras no Salão Leste do Planalto, no segundo andar do palácio. Formal nas declarações, estilo oposto ao do presidente, o porta-voz sempre encerra a fala com o dizer franciscano "Paz e bem".

Temer também teve um porta-voz, o diplomata Alexandre Parola, que fazia declarações à imprensa, porém com raros espaços para perguntas. Parola, em geral, apenas lia uma nota da Presidência sobre determinado assunto.

'Não é bem assim'

A rotina do Planalto também é marcada, em alguns momentos, por informações desencontradas ou recuos.

Na primeira semana de governo, Bolsonaro anunciou aumento de Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) e a possibilidade de redução da alíquota de Imposto de Renda (IR). No mesmo dia, foi desmentido pela Receita Federal.

Na última segunda-feira (24), Bolsonaro disse que há "99% de chance" de o GP Brasil de Fórmula 1 voltar ao Rio de Janeiro. O CEO da categoria, Chase Carey, falou ao lado do presidente que segue as negociações com São Paulo.

A novela dos decretos das armas também serve de exemplo. Na terça-feira, o porta-voz afirmou que Bolsonaro não revogaria decretos editados em maio. O presidente revogou os atos e editou outros quatro na sequência.

Desde janeiro foram sete decretos, com correções, revogações e mudanças nas regras de posse e porte de armas.

Bolsonaro almoça no bandejão do Palácio do Planalto com ministros

Surpresas e passeios

Almoço no "bandejão" do Planalto ou com caminhoneiros em uma churrascaria de beira da estrada, ida a um supermercado para comprar xampu, mergulho e passeio de moto ou moto aquática.

Informal, Bolsonaro surpreende ao longo de seis meses com atos que fogem à rotina de um presidente da República, muitas vezes fora da agenda de trabalho e para surpresa da própria segurança.

Em uma terça-feira de março, o presidente acompanhou a mulher, Michelle, em uma sessão de cinema em um shopping de Brasília para assistir ao filme "Superação – o milagre da fé". Já durante o feriadão de Páscoa, o presidente aproveitou a visita ao Guarujá para dar um passeio de moto.

Deputado federal por 28 anos, Bolsonaro decidiu levar pessoalmente ao Congresso projetos que considera importantes. Foi assim com a proposta de reforma da Previdência, com o projeto de mudanças nas aposentadorias de militares e com o projeto que altera trechos do Código Brasileiro de Trânsito.

Bolsonaro também fez uma visita de surpresa à Câmara para acompanhar uma sessão solene em homenagem ao humorista Carlos Alberto de Nóbrega. Ele atravessou a pé o trecho de poucos metros que separa o Planalto do Congresso, percurso que presidentes costumam fazer de carro.

O presidente Jair Bolsonaro, em 7 de junho, na Formatura do curso de habilitação para promoção a sargento

Marcos Corrêa/PR

Militares e religiosos

Capitão reformado do Exército, Bolsonaro tem um vice-presidente general e sete ministros militares ou com passagens pelas Forças Armadas. O apreço à caserna também se reflete nos discursos sobre patriotismo e na agenda, com participações frequentes em cerimônias militares fora do Planalto.

Além de prestigiar passagens de comandos das Forças e de cerimônias de entregas de comendas, as quais outros presidentes participavam, Bolsonaro foi, por exemplo, ao 211º aniversário do Corpo de Fuzileiros Navais, à formatura de sargentos da Aeronáutica e ao 218º aniversário de nascimento do Marechal Emilio Luiz Mallet, patrono da arma de artilharia do Exército.

Bolsonaro também tem reunidos seus ministros às 8h para cerimônias de hasteamento da bandeira nacional, antes das reuniões do conselho de governo. Ele, a primeira-dama, Mourão e ministros ficam perfilados para a cerimônia, com a execução do hino nacional. O presidente já convocou sua equipe para cerimônias do tipo no Planalto e no Alvorada.

Com base eleitoral e política conversadora nos costumes, Bolsonaro recebe lideranças religiosas ou participa de eventos de igrejas com maior frequência do que antecessores. Vale o mesmo para os discursos do presidente, que repete o slogan de campanha "Brasil acima de tudo, Deus acima de todos".

Em março, o presidente compareceu a um evento de uma igreja cristã em Brasília chamado "escola de hombridade", destinado apenas para homens.

Em maio, houve um ato religioso no próprio Planalto, de "consagração do Brasil a Jesus Cristo por Meio do Imaculado Coração de Maria", com a entrega de uma imagem de Nossa Senhora para a Presidência da República.

No mês passado, Bolsonaro se tornou o primeiro presidente a participar da Marcha para Jesus, que reúne evangélicos em São Paulo.

Metáforas de relacionamentos

Bolsonaro é adepto das metáforas, em especial as que versam sobre relacionamentos. Ele tratou como uma briga de namorados uma rusga com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, que anunciou estar fora da articulação da reforma da Previdência.

" Você nunca teve uma namorada? E quando ela quis embora, o que você fez para ela voltar? Conversou?", disse.

Antes da demissão do então ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodríguez, Bolsonaro explicou a possível saída assim:

"Na segunda tira a aliança da mão direita e, ou vai para a esquerda ou vai para a gaveta".

Já a demissão de Gustavo Bebianno foi descrita como um quase casamento que "prematuramente se desfez".

Outra metáfora que chamou atenção, mas fora da ceara nupcial, foi usada para comentar eventual arrependimento sobre declarações polêmicas do passado.

"Eu não posso me arrepender de ter feito xixi na cama [quando era criança, aos 5 anos de idade]. Saiu, pô", relatou Bolsonaro aos risos em um café com jornalistas.

Relação com a família

Os três filhos do primeiro casamento são presentes no dia a dia do presidente. O senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) e o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) já integraram comitivas do pai em viagens. O vereador do Rio Carlos (PSC-RJ) marca forte presença nas redes sociais e aconselha o pai.

Bolsonaro já teve de dizer que os filhos não mandam no governo e que não seguem Carlos em 100% das orientações. Carlos tem apreço pelo ideólogo de direita Olavo de Carvalho, cujos alunos ocupam posições no governo.

Bolsonaro de tempos em tempos elogia o trabalho de Olavo na queda de braço contra o que considera ideologias de esquerda e convidou o ideólogo para um jantar de lideranças conservadoras durante visita aos Estados Unidos.

A residência oficial do Palácio da Alvorada voltou a ter moradores – Bolsonaro, a primeira-dama Michelle, a filha Laura e a enteada Letícia. Antecessor de Bolsonaro, Michel Temer ficou poucos dias no local e optou por viver com mulher e filho no Jaburu, residência do vice-presidente.

O local também passou a receber mais turistas, muitos deles apoiadores de Bolsonaro, que chegam cedo à portaria do palácio, já que o presidente tem o hábito de sair para conversar e tirar fotos, em especial nos sábados e domingos.

O presidente Jair Bolsonaro e o ministro Sérgio Moro, no Estádio Mané Garrincha, durante conversa no intervalo do jogo do Flamengo

Hamanda Viana/TV Globo

Futebol

Torcedor do Palmeiras, Bolsonaro gosta de usar nos momentos de folga e, até de trabalho, camisas de times de futebol. Trajado de camisa do Palmeiras, blazer, abrigo e chinelos, já comandou reunião no Alvorada sobre Previdência.

O presidente apareceu com camisas da seleção e de outros clubes, como Internacional e Flamengo – tendo indo a um jogo do time ao lado do ministro Sérgio Moro. No encontro com Donald Trump na Casa Branca, os chefes de Estado trocaram camisas de suas seleções.

O gosto por futebol também aparece nas agendas presidenciais. Bolsonaro teve audiência com o ex-jogador Ronaldinho Gaúcho e foi ao estádio acompanhar dois jogos da seleção.

Fonte: G1

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