Não é de hoje que Ronaldo Caiado dá alfinetadas em Bolsonaro. Quando o ex-presidente liderava o Executivo, Caiado, governador de Goiás, aproveitava qualquer brecha para criticar, mesmo que de forma sutil.
Caiado é o que se pode chamar de "animal político". Sempre atento às oportunidades, ele entrou em cena no final dos anos 1980, liderando a União Democrática Ruralista (UDR) em uma época em que se declarar de "direita" exigia coragem. Após deixar o comando da UDR, candidatou-se à presidência da República nas eleições de 1989. Começou bem a campanha, mas, em certo ponto, sua candidatura despencou, terminando o pleito em 10º lugar, com apenas 0,68% dos votos, correspondentes a 488.872 eleitores.
Passada a tentativa frustrada, não parou de disputar eleições e foi vitorioso: governa Goiás desde 2019, após uma longa carreira que inclui mandatos como deputado federal (1991-1995 e 1999-2015) e senador (2015-2019). A partir daquela derrota de 1989, Caiado sempre buscou um lugar de destaque nas disputas eleitorais.
Seu sonho de alcançar a presidência da República continuou. Por isso, suas ações são calculadas: quando percebe o "cheiro de sangue", ataca. Seu alvo preferido? Bolsonaro. Durante a pandemia, por exemplo, Caiado rompeu com o presidente, possivelmente aproveitando o desgaste do chefe do Executivo. Na época, já esperava se apresentar ao país como uma alternativa viável para a direita.
A popularidade de Bolsonaro, todavia, sempre foi estonteante, e adversários que se opunham a ele rapidamente perdiam força política, desaparecendo do cenário eleitoral. Caiado, ao ver essas figuras relevantes serem descartadas, moderava suas críticas para não correr o risco de também ser "escanteado". Exemplos não faltaram: Joice Hasselmann, Alexandre Frota, João Doria e Sérgio Moro (este só não naufragou porque deu meia volta e, humildemente, pediu ajuda ao ex-presidente). Era evidente que só o temor de ser visto como "traíra" refreava o primeiro mandatário goiano.
Bolsonaro, ciente do caráter circunstancial de sua aliança com Caiado, sabia que a fidelidade do governador tinha prazo de validade. Bastaria uma chance de Caiado concorrer ao Planalto para que o "instinto beligerante" do governador despertasse. Por isso, Bolsonaro mantinha essa aliança enquanto lhe era conveniente, aplicando o conhecido "bate e assopra".
Recentemente, Caiado fez críticas diretas a Bolsonaro: "Ele [Bolsonaro] caminhou com quem o apoiava, mas foi extremamente deselegante com os deputados, prefeitos e governadores que estiveram ao seu lado". Suas declarações ácidas visavam desgastar o oponente: "Busquei diálogo, entendimento… e nada. Simplesmente lançaram candidatos nas principais cidades sem sequer dar resposta."
Bolsonaro, por sua vez, não ficou calado. Ele definiu o comportamento do antigo aliado: "O Caiado é uma pessoa que, se você o desagrada, ele vira seu inimigo. Em quatro momentos, ele rompeu comigo enquanto eu estava na presidência da República." Essas palavras deixaram claro que o governador de Goiás não é um parceiro confiável.
Caiado parece acreditar que Bolsonaro perdeu a força entre o eleitorado e, por isso, tornou-se um alvo fácil para sua artilharia verbal, especialmente com a inelegibilidade do ex-presidente. Essa estratégia, entretanto, pode estar equivocada. A política é dinâmica; quem garante que Bolsonaro não possa se tornar elegível novamente?
Mesmo sem a elegibilidade, Bolsonaro provavelmente será o cabo eleitoral mais influente que um candidato poderá ter– e tudo indica que o escolhido será o governador de São Paulo, Tarcísio Gomes de Freitas. O eleitorado, inclusive, tem demonstrado repúdio à traição.
Para entender o risco que Caiado corre, basta pensar em um cenário futuro: de um lado, Bolsonaro; de outro, Caiado. Qual deles atrairá multidões? Se persistir nesse caminho, o governador goiano pode acabar repetindo o resultado vexatório de 1989. A ver. Siga pelo Instagram: @polito