Nas últimas semanas, o Congresso Nacional, com destaque para o Senado Federal, deu início a uma ofensiva contra o STF (Supremo Tribunal Federal), com a apresentação de Propostas de Emenda à Constituição (PECs) que propõem, por exemplo, fixar mandatos de 8 a 16 anos para ministros da Corte, impedir a recondução e estabelecer idade mínima de 50 anos para os indicados. Entre as propostas, uma das matérias que volta ao debate é a PEC 16/2019, de autoria do senador Plínio Valério (PSDB-AM), e que estabelece período de oito anos, não renováveis, para manutenção dos ministros no STF e limita o prazo para indicação e sabatina dos escolhidos. O texto impulsiona o debate entre parlamentares e causa um mal-estar entre membros das instituições, incluindo declarações de ministros condenando as propostas e senadores acusando os magistrados de “exageros”. Ainda que seja polêmico, Valério nega que o objetivo da PEC seja “revanchismo” e refuta a hipótese de nova crise entre os Poderes. “Eles exageraram, agora eles escancararam e colocaram na cara dos brasileiros que eles estão legislando. Então é hora de uma resposta. Agora, não é um movimento de ofensiva. O Supremo não é supremo. É só pelo nome, mas não existe Supremo acima de tudo e de todos, tanto é que a Constituição diz que os senadores podem cassar ministros”, afirma em entrevista ao site da Jovem Pan. Autor da proposta, o tucano admite, no entanto, que o texto não tem votos necessários para uma aprovação imediata. “Poderíamos aprovar a toque de caixa, mas não vejo essa disposição para aprovar”, completou. Confira os principais trechos da entrevista:
O senhor é autor da PEC 16/2019, que atribui mandato aos ministros do Supremo. Na prática, qual a proposta do texto? A PEC é bem simples. Ela limita os mandatos do STF a oito anos, não renováveis, e mantém a coluna vertebral que existe atualmente: mesmo idade (do ministro) para indicação, a prerrogativa do presidente da República de indicar o sucessor e do Senado Federal em sabatinar. A novidade que é traz limitações. Ao vagar um cargo, o presidente terá até 30 dias para indicar, o Senado até 60 dias para sabatina, e o Executivo, sancionar. Isso dá agilidade. Em março de 2019, quando protocolei a PEC, não sabia do episódio que aconteceria com o André Mendonça, mas já prevíamos a demora, em função das negociações que se estendem em demasia e isso prejudica o andamento do Supremo. A CCJ também não tem tempo (atualmente) para a sabatina. O caso do Mendonça levou quase quatro meses. Isso prejudica muito.
Considerando que trata-se de uma proposta de 2019, o que impulsionou a PEC a retornar, neste momento, ao centro do debate no Senado? A expectativa ao caminhar na estrada da política nos traz entendimentos. Apresentamos assuntos importantes e anos depois eles voltam, os temas vêm à tona. Quando o governo não quer, a proposta é engavetada e o assunto morre. Mas agora, o assunto da fixação de mandato é porque eles (ministros) estão abusando. A proposta das PECs é sadia para a população, que querem um freio ao Supremo, embora a aprovação não seja para agora, apenas para os ministros que vão entrar depois da aprovação. Então a população não deve esperar que Moraes e Barroso saiam agora, só após os 75 anos.
Mas qual a vantagem de se estabelecer um prazo de mandato? Atualmente, ao entrar e saber que só vai sair aos 75 anos, é comum que o ser humano ache que é intocável, que relaxe ou exagere – e não estou generalizando. Vou citar exemplos: os ministros Alexandre de Moraes e Barroso exageram. Eles não têm que dar satisfação e pensam que podem tudo. Veja só, eles começaram devagarzinho, passaram a boiada e agora querem leis sobre aborto, marco temporal, drogas e sindicatos. Já o mandato de oito anos faz que as pessoas se sintam um ser humano normal. Esses dois não se sentem normais, a longevidade causa isso. O mandato de oito anos fará com que um ministro não se torne semi-deus.
Além da PEC de sua autoria, já há outras propostas semelhantes em tramitação no Senado, como a PEC 51/2023, do senador Flávio Arns, que também defende mandato para o STF, mas de 16 anos. É possível que as propostas sejam unificadas? O senador Jorge Kajuru também está colhendo assinaturas para uma outra proposta e com certeza outras ainda virão. O que eles estão fazendo poderiam ser apresentadas como emendas, mas cada cabeça uma sentença. No regimento interno, qualquer assunto de PEC ou Projeto de Lei que tenha o mesmo teor, sentido ou objetivo, deve ser apensado à matéria original. Conversei com o presidente Rodrigo Pacheco e tenho a garantia de que o assunto começa com a nossa proposta. Começa a discussão, o relator vai fazer o texto substitutivo unindo a minha proposta, do senador Kajuru, Flávio Arns e outras. Ele que vai escolher um tempo ou período para o mandato. Certamente surgirão novas ideias e dificilmente vai ficar em oito anos de mandato. Não acho que deve ser mais, porque oito anos é simbólico por ser o tempo de mandato de um senador. Outros propõem 12 anos como ideal, mas também falam em 16 anos, o que considero muito.
Ao longo da semana, o ministro Gilmar Mendes criticou à iniciativa de fixar um período de mandato para o STF e chegou a afirmar que era “comovente” o esforço do Senado. O que o senhor responderia a Gilmar? Respondi o ministro na última quarta-feira. Ele falou algo que ficou sensibilizado conosco, quis dizer que tem pena da gente. Ele acha que (a PEC) não vai para frente, mas eu disse que isso não depende ele. É um erro um ministro tuitar, ele tem que ficar na dele. Não é legislador. Fui eleito para legislar, faço meu trabalho. Ele deve interpretar a Constituição e fazer o trabalho dele.
Podemos dizer que essas propostas visam “enquadrar” o Judiciário? É uma maneira de responder ao exagero. Eles exageraram, agora eles escancararam e colocaram na cara dos brasileiros que eles estão legislando. Então é hora de uma resposta. Agora, não é um movimento de ofensiva. Participar de um movimento para enquadrar o Supremo? Adoraria. Mas não é o caso. Estamos com o senador Rodrigo Pacheco para tudo que ele colocar para votar que simbolize, na prática, que o Supremo não é supremo. É só pelo nome, mas não existe Supremo acima de tudo e de todos, tanto é que a Constituição diz que os senadores podem cassar ministros.
O senhor acredita que o possível avanço da PEC de sua autoria e de outros temas relacionados, como a PEC 8/2021, pode fazer escalar a crise entre os Poderes? Não deveria, porque não vai atingir os atuais ministros. Quando o Gilmar reage, a proposta não é para eles, que vão sair aos 75 anos. Não é revanchismo, é aperfeiçoamento do sistema, da lei. Em hipótese alguma é revanchismo. Gilmar, Alexandre e Barroso não vão sentir dor, a PEC não os atinge. Então é infundado esse tipo de acusação.
O atual presidente da CCJ, senador Davi Alcolumbre, já inicia articulações para sua candidatura à presidência do Senado. A PEC do senhor ficou quatro anos parada, mas voltou agora a tramitar. O senhor acredita que Alcolumbre pode usar esse tema para conseguir votos e se consagrar o sucessor de Pacheco? Não vejo assim. Neste momento, em relação a essa PEC, a postura dele está me desagradando. Se ele está pensando que a PEC vai dar votos para a presidência, está muito errado. Os que votam contra o STF e querem frear a Corte não elegem um presidente, não são maioria. A estratégia dele está errada. Apresentei essa PEC há quase cinco anos, faltam cinco meses para completar cinco anos. Então não acredito que ele pensa em agradar a direita, porque eles não elegem presidente do Senado.
E qual a expectativa do senhor sobre a PEC dos mandatos? É possível que aconteça ainda neste ano? A proposta tem chances agora, mas não tem votos necessários. Vai depender da tramitação e discussão. Torço para estar errado, mas acredito que começa o relator a estudar o relatório e só vota ano que vem, embora a gente vá lutar para que seja neste ano. Poderíamos aprovar a toque de caixa, mas não vejo essa disposição para aprovar. Ainda não temos o relator, mas queremos alguém de confiança e que não seja governista ou amigo do Dino.
Sobre Flávio Dino, é possível que ele seja o próximo ministro do STF… Tudo é possível, mas ele vai sofrer resistência, porque a gente não gosta dele. Não gostamos da soberba dele, da forma que ele trata a Constituição, os adversários e opositores. Muitos como eu não gostamos da forma como se expressa em relação a que ele acha que pode fazer.