Uma das maiores zebras do futebol brasileiro completou 19 anos nesta sexta-feira, 30. Em 30 de junho de 2004, o país viu o pequeno e desconhecido Santo André calar um Maracanã com mais de 70 mil torcedores do Flamengo e faturar o primeiro e até então único título da Copa do Brasil de sua história mais que cinquentenária. Naquela noite de quarta-feira no Rio de Janeiro, o Ramalhão marcou um “novo Maracanazzo”, assim como o Uruguai de 1950 sobre a seleção brasileira, ao vencer o Rubro-Negro por 2 a 0, gols de Elvis e Sandro Gaúcho, após empate em 2 a 2 no jogo de ida da final no extinto Parque Antárctica – já que o Bruno José Daniel, casa do time ramalhino, não tinha a capacidade de público exigida pela CBF.
No pré-jogo havia, inclusive, nos arredores do Maraca, faixas de campeão com as marcas do Flamengo já sendo vendidas entre os torcedores e até um possível show da Ivete Sangalo pronto nos bastidores em caso de título flamenguista, como contou Sérgio Soares, ex-jogador da equipe do ABC paulista que estava como auxiliar do técnico Péricles Chamusca, à Jovem Pan em 2017.
Um dos autores dos dois gols daquela conquista inédita, Sandro Gaúcho relembra com carinho o jogo mais emblemático de sua carreira. “A conquista foi três dias depois do meu aniversário [dia 27 de junho], foi um presente de Deus na minha vida. Foi um êxtase tremendo [calar o Maracanã], para coroar meu final de carreira”, disse ao site da Jovem Pan o ex-camisa 9, hoje com 55 anos e que vive nos Estados Unidos. No dia da finalíssima de 2004, acabara de completar 37 anos. Sandro Gaúcho contou também como o vestiário do Santo André reagiu ao favoritismo adversário e ao clima de “já ganhou” do lado do Flamengo, que tinha jogadores como Júlio Cesar (goleiro), Júnior Baiano (zagueiro), Athirson (lateral) e Felipe (meia). “Todos da época davam o Flamengo como favorito. Nos concentramos três dias e, paralelamente, víamos entrevistas e notícias. No estádio, quando o Sérgio Soares [auxiliar] nos passou o palco formado, nos motivou ainda mais. O Péricles [Chamusca] também foi feliz na preleção e motivação”, recorda.
Bastidores que também são contados em ricos detalhes no livro “Eles calaram o Maracanã”, do jornalista e escritor Vladimir Bianchini, torcedor do Ramalhão. “Li tudo o que saiu na imprensa sobre o time entre 2003 e 2004. Cerca de 80% do que coloquei no livro não saiu em nenhum veículo de mídia”, afirma sobre a obra de 216 páginas que traz a história desde antes do torneio nacional iniciar, quando o time foi montado. “Tirando para quem é torcedor do Santo André, o jogo é lembrado como “a derrota do Flamengo”, “a grande zebra”. Pouco se fala dos heróis e da conquista, então procurei dar voz aos vencedores”, completa Bianchini, que revela não somente as histórias positivas, mas também de brigas internas entre o elenco durante a campanha.
O autor da publicação não esteve no Maracanã no dia, pois estudava em Bauru na época, mas acompanhou nas ondas da Jovem Pan toda a repercussão depois da partida. “A TV aberta cortou a transmissão após a entrega da taça, então ouvi todo o pós-jogo da Jovem Pan com as entrevistas do Wanderley Nogueira”, recorda. A trajetória do clube naquela Copa do Brasil já resume o tamanho do feito andreense. Além do Flamengo na grande final, times como Atlético-MG (segunda fase), Guarani (oitavas de final) e Palmeiras (quartas de final) ficaram para trás, assim como agremiações de menor expressão, como Novo Horizonte (primeira fase) e XV de Novembro (semifinais).
Dezenove anos depois, o Santo André busca retomar os tempos áureos da década de 2000, quando, além da Copa do Brasil de 2004, chegou a jogar a Libertadores de 2005, a Série A do Brasileirão em 2009 e conquistar o vice-campeonato paulista de 2010. Atualmente, a equipe paulista está em ação na modesta Série D do Campeonato Brasileiro, além da Copa Paulista. No âmbito estadual, está na divisão de elite do Paulistão. Executivo de futebol do Ramalhão nos dias atuais, Marco Gama não fazia parte da diretoria nem do elenco de 2004, mas sabe da magnitude do troféu vencido e procura passar o peso dessa história para os jogadores que chegam no clube. “Existe de parte do torcedor e da diretoria sempre pontuar o que aconteceu em 2004 e a responsabilidade de você defender uma história tradicional. Não nos incomoda ouvir e ser cobrado para que alcancemos novamente esse caminho”, afirma o dirigente.